No evangelho de João 4 temos o tão conhecido e belo encontro de Jesus com a mulher samaritana. O mestre judeu quebrou todos os protocolos ao escolher como destino um lugar habitado por samaritanos, um povo que vivia em rivalidade com os judeus há muitos séculos. O ato de Jesus se aproximar de uma mulher, iniciar uma conversa em público com ela e transgredir a legislação - que dizia que um judeu era terminantemente proibido de comer ou beber com samaritanos -, revela a coragem de romper todas as barreiras culturais, religiosas e morais da época. Essa atitude nos ensina que a sua graça não conhece fronteiras quando se trata de vidas. Jesus não teve medo de ser mal falado, porque não estava preocupado com a manutenção de dogmas culturais sem valor, mas com a restauração de uma mulher com um passado difícil e provavelmente desprezada por muitos. Jesus deve ser nosso paradigma. Como igreja devemos ter a mesma ousadia em valorizar pessoas em detrimento de coisas e costumes.
Outra coisa que me chama atenção é que Jesus identifica na mulher samaritana uma sede existencial e se oferece como o antídoto definitivo, afirmando “Quem beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede”.
Há uma sede humana universal por sentido na vida. Agostinho define bem essa sede e a fonte certa para saciá-la afirmando o seguinte: “Fizeste-nos para ti, e nosso coração está inquieto até encontrar descanso em ti”! “O homem não sai dos confins do próprio ser para se afundar no nada, mas sai de si para lançar-se em Deus, o qual é o único ser capaz de levar o homem à perfeita realização de si mesmo”.
Pessoas que não conseguem encontrar a fonte certa (Jesus Cristo) como sentido existencial, criam mecanismos de satisfação parcial. No caso da mulher samaritana, o texto deixa claro que ela desenvolveu uma afetividade adoecida que foi movida por uma carência que não poderia ser suprida por homem algum senão apenas por Jesus.
Existem muitos mecanismos de satisfação parcial. A sexualidade desenfreada, a supervalorização do trabalho como fim em si mesmo, o apego aos bens materiais, o acumulo de riquezas e os vícios são mecanismos de satisfação parcial que estão bem presentes entre nós e funcionam aliviando momentaneamente a angustia e inquietude da alma humana.
“Somos criaturas divididas, correndo atrás de álcool, sexo e ambições, desprezando a alegria infinita que se nos oferece, como uma criança ignorante prefere continuar fazendo bolinhos de areia numa favela, porque não consegue imaginar o que significa um convite para passar as férias na praia. Contentamo-nos com muito pouco.” C.S.Lewis
Além de transpor as barreiras culturais e se colocar como o único que pode saciar a sede da alma humana por significado, Ele também muda a liturgia.
Um dos motivos pelos quais os judeus não se davam com os samaritanos era porque os samaritanos eram mais relaxados na sua maneira de entender o ritual de purificação, e também pelo fato de que tinham outro lugar separado para a adoração, diferente dos judeus que adoravam em Jerusalém. Assim que a mulher percebe a divindade de Jesus ela questiona a teologia que era o motivo da discórdia entre os dois povos.
Jesus impressiona por sua resposta. Ele chama a adoração para o outro nível. Desconstrói os lugares e ritos sagrados e leva a liturgia para o coração. Com Jesus entendemos que a nossa vida deve ser um culto contínuo a Deus. Que a única coisa que se faz necessária na adoração para que Deus a receba, é que seja verdadeira. Todo dia é dia santo e todo lugar é propício para a adoração. Todas as tribos, línguas e nações juntas para adorar o Senhor das nações.
Tomas
